Quando falamos em anamnese farmacêutica estamos tratando da fase de coleta de dados, onde é feita uma espécie de entrevista com o paciente. Este procedimento é uma etapa fundamental do atendimento na farmácia clínica. Seu objetivo é ir além da identificação, mas principalmente compreender o histórico de saúde familiar e identificar os medicamentos que, porventura, já são utilizados.
Uma vez que a consulta farmacêutica torna-se uma opção mais acessível aos pacientes, sendo segura e eficaz para identificar sintomas clínicos e possíveis interações medicamentosas, cabe ao farmacêutico proceder com o máximo critério.
Além disso, a farmácia clínica possui seu lugar na sociedade, exercendo um papel vital para a promoção da saúde de comunidades inteiras. Nesse trabalho, também se destaca o combate à automedicação, que já se tornou um hábito comum entre os brasileiros.
De acordo com uma pesquisa realizada pelo Conselho Federal de Farmácia (CFF) em 2019, cerca de 77% da população brasileira se automedica. Destes, 47% o fazem pelo menos uma vez por mês e outros 25% se automedicam semanalmente.
Mas afinal, qual a relação entre anamnese farmacêutica e a automedicação? Veja a seguir!
Anamnese farmacêutica x automedicação
Embora os malefícios da automedicação não sejam novidade, o fato dessa prática ser muito comum faz com que a responsabilidade do farmacêutico vá além do atendimento clínico. Sobretudo porque todo medicamento está sujeito a apresentar efeitos adversos, a anamnese farmacêutica deve atuar na reconciliação medicamentosa.
Entre as principais complicações que podem ser causadas pela ingestão de medicamentos incorretos, em quantidade excessiva ou combinação equivocada de fármacos, podemos citar:
- intoxicação;
- reação alérgica;
- interação medicamentosa;
- dependência.
Além disso, no caso da automedicação, ao aliviar momentaneamente os sintomas torna-se mais difícil avaliar o quadro e fornecer o diagnóstico correto. Outro fator importante é quanto à ingestão recorrente de alguns remédios, que podem levar o organismo a tornar-se resistente à substância, prejudicando o tratamento.
Desse modo, ao realizar o processo de forma adequada, é possível identificar os casos de automedicação e ajudar a eliminá-los ou reduzi-los. Assim, o paciente encontra uma indicação de tratamento mais segura, alcançando os resultados desejados através do uso consciente dos fármacos.
Como a anamnese farmacêutica deve ser conduzida?
A anamnese farmacêutica se dá através de algumas etapas, que seguem uma sequência onde cada item de avaliação possui um objetivo. Nesse sentido, o atendimento na farmácia clínica deve seguir esse caminho para avaliar criteriosamente a condição do paciente.
As etapas que compõem a avaliação e entrevista são os seguintes, na ordem:
- Identificação do paciente
- Queixa principal
- História da doença atual
- História médica pregressa
- História fisiológica
- História familiar e social
- Uso e revisão de medicamentos
Somente assim, será possível prescrever medicamentos corretos e seguros, promovendo um tratamento eficaz e de qualidade. Portanto, os princípios da investigação feita por médicos ou farmacêuticos é o mesmo: conhecer e analisar o histórico de saúde do paciente.
Quais dados devem ser coletados durante a entrevista farmacêutica?
Profissionais da saúde costumam registrar informações através do modelo SOAP (Subjective, Objective, Assessment, Plan). Ou seja, a organização do registro é dividida em:
- Subjetivo: Informações do paciente (S)
- Objetivo: Observações clínicas e resultados de exames (O)
- Avaliação: Análise explica os significados dos dados subjetivos (A)
- Prescrição: Decisão sobre a conduta a ser tomada (P)
Na farmácia clínica, esse formato possibilita organizar as informações e registrar a evolução do paciente no prontuário, que deve apresentar todos os dados pessoais e de contato, incluindo nome do cuidador e do médico que o acompanha, se houver.
A seguir, é preciso registrar:
- dados subjetivos, ou seja, aqueles que não podem ser medidos diretamente, como por exemplo, os sintomas apresentados, entre outros;
- dados objetivos, que são aqueles mensuráveis e observáveis, como resultados de exames ou testes laboratoriais remotos;
- análise de todos os dados, sejam eles objetivos ou subjetivos, visando identificar as necessidades e problemas de saúde do paciente, os fatores agravantes dos sintomas e aspectos que indiquem a necessidade de encaminhamento do paciente;
- elaboração do plano, onde devem ser definidos os objetivos farmacêuticos e as intervenções necessárias, que podem incluir terapias farmacológicas ou outro tipo de intervenção.
Ao final da consulta, é necessário entregar ao paciente a Declaração de Serviço Farmacêutico, que registra e materializa o atendimento, conforme orientação da RDC 44/2009.
5 dicas para aplicar a anamnese farmacêutica
Para que o farmacêutico possa otimizar sua rotina de trabalho na farmácia clínica e tornar o processo realmente eficiente, é importante criar um padrão de abordagem. Entretanto, é fundamental ter atenção para que o atendimento não seja engessado, afinal este é, muitas vezes, o primeiro contato que estabelece a relação com o paciente.
Vejamos então algumas dicas para aplicar a técnica de anamnese farmacêutica, seguindo princípios éticos e humanizados.
1. Investigue a história clínica e pessoal do paciente
Após coletar as informações básicas de identificação do paciente, é hora de investigar seu histórico pessoal e clínico. Isso inclui problemas de saúde na infância, gestação, aspectos hereditários, entre outros assuntos.
Buscar saber quais são os problemas de saúde mais recorrentes, mas também estar atento à trajetória de vida, pode levar a descobertas importantes. As relações interpessoais, sejam elas familiares, profissionais ou sociais também merecem ser investigadas e avaliadas.
2. Sempre adote uma postura profissional
A figura do farmacêutico tende a ser encarada com menos seriedade por ser menos intimidadora que a imagem do médico. Isso faz com que alguns pacientes não encarem a consulta farmacêutica da mesma forma, estando mais à vontade para dar informações importantes.
Por tanto, é importante se valer desse benefício, mas sem deixar de manter uma postura séria e profissional, porém respeitosa e amigável. Em qualquer situação, deve-se evitar opiniões e exemplos pessoais, direcionando o foco para as questões clínicas.
3. Aplique a anamnese para personalizar o atendimento
Realizar um atendimento personalizado melhora a experiência e a satisfação do paciente, em todos os sentidos. E a conduta da anamnese farmacêutica possibilita essa personalização de maneira bastante eficiente. Essa é também uma forma de fidelizar os pacientes para a utilização da farmácia clínica, desde que haja acolhimento e conforto.
4. Auxilie o paciente a inserir a medicação na sua rotina
Facilitar o uso dos medicamentos também é uma forma de promover uma anamnese farmacêutica eficiente e potencializar os resultados do tratamento. Sobretudo os mais idosos, que encontram dificuldade para se lembrar de horários, quantidades etc.
Desse modo, o farmacêutico pode atuar como apoio, criando tabelas e orientando para algumas estratégias que adaptem a medicação à rotina do paciente.
Como exemplo, é possível indicar o uso de aplicativos de celular ou alarmes personalizados com lembretes. Ou mesmo elaborar uma lista de cada medicamento, com quantidades e horários, identificando-os por cores.
5. Conquiste a confiança do paciente
Um atendimento humanizado na farmácia clínica é parte essencial de uma anamnese farmacêutica. Principalmente porque dessa forma é possível estabelecer uma relação de confiança, deixando o paciente à vontade para exprimir suas queixas.
Para isso, é preciso enfatizar o sigilo das informações e lembrar que a sinceridade é imprescindível para que o farmacêutico possa chegar a um diagnóstico mais preciso.
Ou seja, essa relação deve se basear em honestidade e empatia, causando um impacto positivo no resultado da consulta.
Por que o acompanhamento do farmacêutico é importante após anamnese?
Mesmo após a anamnese, é muito importante que haja um acompanhamento do paciente. Isso serve para que as orientações passadas pelo médico na consulta e pelo farmacêutico ao realizar a dispensação do fármaco sejam checadas.
Afinal, nem sempre o momento da consulta é o bastante para garantir que o paciente tenha, de fato, compreendido as indicações. O que pode comprometer o uso correto dos medicamentos e, consequentemente, o tratamento.
Para entender melhor sobre a responsabilidade do farmacêutico na prescrição de medicamentos, não deixe de ler o artigo “RDC 585 e RDC 586 do CFF: atribuições do farmacêutico e a prescrição de medicamentos“