Publicado em 26 novembro 2019 | Atualizado em 22 junho 2021

Com as melhorias no sistema de saúde conquistadas ao longo dos anos estando em risco, aliadas à ausência de gestão e mão de obra qualificada,  segue o preocupante cenário da saúde pública no Brasil.

Carência de remédios e insumos diversos, ausência de equipamentos hospitalares, falta de médicos, enfermeiros e profissionais da saúde qualificados e ausência de investimentos no SUS são alguns dos problemas que assombram o sistema que já foi considerado um dos melhores do mundo.

Além disso, em 2019 ainda tivemos uma redução na cobertura vacinal no país devido ao reflexo da desinformação da população aliado aos diversos gargalos nos processos do SUS, já que o avanço desta depende diretamente da administração adequada de todos os setores.

A partir desse retrocesso, veio o retorno de doenças já consideradas erradicadas no Brasil, como o sarampo, e o crescimento do número de pessoas com depressão. Segundo dados da OMS, até 2020 essa será a doença mais incapacitante do mundo.

Ainda de acordo com a organização, o Brasil possui o maior número de casos em toda a América Latina, com um total de 11,5 milhões de depressivos, ou seja, de 6% dos brasileiros.

Os problemas não param por aí. Conforme um estudo liderado por Harvard em 12 universidades e instituições brasileiras, devido à dificuldade dos repasses federais destinados à saúde para as cidades, todo o trabalho realizado pelo SUS para trazer melhorias no sistema de saúde brasileiro ao longo dos anos se torna cada vez mais comprometido.

Com gastos públicos cada vez mais restritos, é necessário pensar em novas formas de contornar os obstáculos existentes. Afinal, como reverter esse quadro preocupante?

Melhorias do sistema de saúde: entenda os avanços do SUS e suas limitações

O start dos problemas do SUS se deu desde a aprovação de suas diretrizes. Isso porque, apesar da aprovação de sua implementação, o sistema nunca teve condições materiais para sua completa efetivação.

Apesar da busca pela universalidade, ainda houveram problemas. Tivemos avanços importantes, como novas estratégias baseadas no cuidado com a família, a redução da mortalidade infantil (o Brasil foi um dos primeiros países a bater a meta da OMS) e a ideia de integração entre serviços públicos e privados. Esses avanços possibilitaram uma expansão de serviços no território nacional, porém o financiamento não foi planejado. E, se foi, não foi adequado.

O repasse não chega aos setores que precisam

O gasto com saúde pública no Brasil não é pouco. Cerca de 3,8% do PIB nacional é destinado para esse setor. Mesmo assim, o dinheiro público segue não sendo bem distribuído para contribuir com melhorias no sistema de saúde. 56% dos gastos com saúde são privados, que atendem a 25% da população, contra 44% do público.

Parece mentira, mas somos o único país do mundo com sistema universal público em que o gasto privado é maior, pois não foi planejada a administração deste dispêndio entre setores públicos e privados.

Com um sistema em colapso, vamos conhecer um pouco mais dos desafios da saúde pública no Brasil:

Ausência de médicos e aumento da população de idosos sem suporte de atendimento

De acordo com o estudo da McKinsey & Company, até 2030 a população brasileira acima de 60 anos deverá triplicar e se igualar a pirâmide etária do Japão, no entanto, com um PIB muito inferior. Além disso, apenas 10% dos idosos poderão receber suporte do SUS, já que, ainda segundo o estudo, o Brasil tem cerca de 1 médico para cada mil habitantes, o que representa menos que a média dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico).

Ainda conforme o estudo, em comparação aos EUA, por exemplo, o Brasil apresenta pouco incentivo para a formação de médicos que atuem na saúde básica. A maioria dos profissionais optam pelo caminho da especialização. Enquanto isso, no exterior o setor privado tem crescido em atuação na saúde básica, reduzindo índices de mortalidade infantil e aumentando a expectativa de vida da população.

Falta de leitos

Segundo um levantamento do IPEA, em 2009 o Brasil apresentava cerca de 9 leitos em instituições de longa permanência para idosos a cada mil habitantes, comparado com aproximadamente 55 leitos em países como Reino Unido e no Canadá.

Ainda conforme o estudo da McKinsey cerca de 31% das internações no Brasil poderiam ser evitadas com o aumento do atendimento preventivo em saúde básica.

A média de gastos em casos de alta e média complexidade em países da OCDE é de 55%, enquanto o Brasil apresenta um total de 67% do orçamento gasto nesses casos. Em 2018, segundo o CFM (Conselho Federal de Medicina), o Sistema Único de Saúde perdeu 34 mil leitos de hospitais em 22 estados do país, o que corresponde a uma média de 12 leitos de internação a menos por dia. Isso afetou cerca de 160 milhões de brasileiros dependentes do SUS.

Em casos de cirurgia, muitos procedimentos chegam a ser adiados e, em função desse problema, muitas pessoas continuam a morrer em filas quilométricas nos hospitais públicos no Brasil que não possuem macas ou cadeiras para acomodar os pacientes.

A Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) apontou algumas ações governamentais específicas que podem auxiliar nesse grave problema, entre elas: aprimorar a rede de referências e contra-referências do sistema público de saúde; regionalizar os cuidados especializados; divulgação e educação eficientes dos conceitos de terminalidade e cuidados ao final da vida; e a desospitalização.

Falta de investimentos financeiros

De acordo com o CFM, o investimento público brasileiro ainda é baixo se comparado ao de países com sistemas semelhante ao do país. O gasto médio com saúde por habitante em 2017 foi de R$ 1.271,65 (cerca de US$ 340), somando-se todas as esferas — União, estados e municípios.

Em países como o Reino Unido, por exemplo, considerado modelo de sistema universal, o gasto per capita foi dez vezes maior: US$ 3,5 mil, valor semelhante de investimento feito por países como Canadá e França, conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Existe solução?

O sistema deveria ser suplementar, mas o que existe é um modelo ineficiente que compete por recursos e segue sem resolver os problemas. Não se trata apenas de recursos, não basta apenas aumentar o investimento em saúde.

Os recursos existem, mas o sistema precisa de uma nova ordem, novos meios de organização e distribuição de recursos. A responsabilidade pela prestação de serviço não deve ser apenas do município, ela deve ser compartilhada com o estado e com o governo federal.

Além disso, a chegada das healthtechs surgiu como um ponto de esperança para resolução desses problemas, mas vem acompanhada de muitas adversidades. Boa parte dessas startups de saúde nascem nas universidades e enfrentam muitas dificuldades para serem efetivas e saírem da fase de “projeto” até estarem atuando nas empresas que precisam.

Há muito o que se fazer ainda, principalmente a fomentação de um ecossistema que permita às grandes empresas compartilharem seus conhecimentos e visões de mercado, auxiliando assim as healthtechs a crescerem e consequentemente contribuírem com melhorias no sistema de saúde brasileiro.

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Lucas Almeida

Cofundador e CRO da Nexxto

Trabalho todos os dias para ajudar o setor de saúde a ser mais digital e eficiente, possibilitando que mais pessoas no Brasil tenham acesso a serviços com qualidade e segurança.