Publicado em 26 maio 2020 | Atualizado em 23 junho 2020

As Boas Práticas Clínicas (BPC) ou Good Clinical Practices (GCP) são os procedimentos realizados na preparação, desenvolvimento e documentação dos estudos clínicos para assegurar que os direitos, a segurança e o bem-estar dos pacientes sejam respeitados. Eles também visam garantir que os dados da pesquisa sejam verdadeiros.

As Boas Práticas Clínicas visam nortear e padronizar as pesquisas em todos os países. Permitindo que testes feitos no Brasil tenham o mesmo padrão dos Estados Unidos, Japão, ou França, por exemplo.

Como forma de manter essa qualidade e confiabilidade, processos devem ser seguidos fielmente conforme determinações da Conferência Internacional de Harmonização dos Requerimentos Técnicos para Registro de Produtos Farmacêuticos para Uso em Humanos (ICH – International Conference on Harmonization of Technical Requirements of Registration of Pharmaceuticals for Human Use).

Recentemente, um novo padrão denominado de ICH E6 (R2) aperfeiçoou ainda mais o acompanhamento dos testes. As orientações do guia da Conferência Internacional de Harmonização devem ser seguidas sempre que se faz um estudo clínico. Tendo assim o objetivo de que os dados obtidos sejam submetidos às autoridades regulatórias dos países que dele participam.

É recomendável ainda que os princípios estabelecidos nesse guia sejam aplicados também em qualquer outro estudo clínico que possa ter impacto na segurança e bem-estar de seres humanos.

As responsabilidades de cada um

O manual de Boas Práticas Clínicas assegura o direito dos participantes e também as responsabilidades dos envolvidos. Que são denominados de Patrocinadores, Investigadores e Autoridades Regulatórias.

  • Patrocinadores: uma pessoa, empresa, instituição, ou organização responsável pela implementação, gerenciamento ou financiamento de um estudo clínico;
  • Investigador: pessoa responsável por conduzir o estudo clínico em um centro de pesquisa;
  • Autoridades Regulatórias: instituições que têm poder regulatório.

As boas práticas clínicas

O Guia de Boas Práticas Clínicas (GCP) da FDA (Food and Drug Administration) é um padrão internacional de qualidade definido pelo Conselho Internacional de Harmonização (ICH) que rege as considerações éticas e científicas para projetar, conduzir, registrar e relatar ensaios envolvendo seres humanos.

A conformidade com as Diretrizes da FDA para o GCP em ensaios clínicos ajuda a garantir que os direitos, o bem-estar e a segurança dos participantes do estudo sejam protegidos e que os dados gerados no estudo sejam credíveis.

Governos de todo o mundo utilizam documentos de orientação da ICH para desenvolver regulamentos sobre ensaios clínicos. O primeiro documento de orientação do ICH-GCP (ICH E6: Boas Práticas Clínicas – Diretriz Consolidada) foi publicado em 1996. E serviu para fornecer um caminho a seguir para a aceitação mútua de dados de ensaios clínicos em agências reguladoras de vários países diferentes.

Um adendo a esta orientação original de 1996 foi publicada recentemente pela ICH para tratar dos avanços da tecnologia e de outras questões. Em 01 de março de 2018, a FDA aprovou a sua versão do presente aditamento, conhecida como a E6 (R2) Boa Prática Clínica. Este documento de orientação foi desenvolvido para apoiar e melhorar a qualidade e a eficiência dos ensaios clínicos, mantendo a proteção do sujeito humano e a confiabilidade dos resultados dos ensaios clínicos.

É extremamente importante que todas as organizações regulamentadas envolvidas na pesquisa clínica compreendam e implementem as revisões de políticas detalhadas nesta recente orientação para garantir a conformidade regulatória.

Gerenciamento de qualidade baseado em risco

A nova orientação recomenda que o patrocinador de boas práticas clínicas implemente um sistema de gerenciamento da qualidade (GQ) baseado em risco. Ele deve cobrir todas as etapas dos ensaios clínicos e se concentrar nas atividades dos ensaios essenciais para garantir a proteção do sujeito humano e a confiabilidade dos resultados do estudo.

O gerenciamento da qualidade dos ensaios clínicos inclui o design de protocolos, ferramentas e procedimentos eficazes para a coleta e processamento de dados, bem como a coleta de informações essenciais para a tomada de decisões.

A orientação suporta uma abordagem por projeto para o gerenciamento da qualidade. Para esse fim, os projetos de ensaios clínicos precisam ser apoiados por ferramentas e processos que utilizem dados da vida real e experiências passadas para eliminar alterações evitáveis ​​do protocolo e estudar requisitos e procedimentos que geram baixa conformidade com o protocolo.

Em relação às ferramentas e processos de coleta de dados, as orientações recomendam usar os sistemas de captura eletrônica de dados (CED). Essa recomendação decorre da necessidade de usar as informações do teste em tempo real para tomar decisões informadas.

Principais atributos do gerenciamento de qualidade

A abordagem de GQ baseada em risco deve ser aplicada às tarefas de controle de qualidade e garantia de qualidade. A idéia de identificação e priorização de riscos é um tema comum em todo o documento de orientação, para garantir que as atividades clínicas se concentrem nos riscos clínicos importantes.

A abordagem baseada em risco definida na orientação possui sete atributos principais:

  • Processo crítico e identificação de dados
  • Identificação de riscos
  • Avaliação de risco
  • Controle de riscos (ações de mitigação)
  • Comunicação de risco
  • Revisão periódica de riscos
  • Relatório de risco

Os riscos são priorizados com base em:

  • A probabilidade de o risco acontecer
  • O impacto na segurança ou direitos do paciente e na integridade dos dados
  • Até que ponto o risco é detectável

Essa abordagem de gerenciamento de de qualidade baseada em risco requer análise e aprimoramento contínuos de cada etapa do nível organizacional do patrocinador, bem como no teste clínico.

O documento de orientação também identifica o papel do treinamento abrangente baseado em competências e POPs como elementos-chave de qualquer sistema de GQ. Os POPs devem cobrir a configuração, instalação e uso do sistema. Eles ainda devem descrever a validação do sistema e testes de funcionalidade, coleta e manuseio de dados, manutenção do sistema, medidas de segurança do sistema, controle de alterações, backup de dados, recuperação, planejamento de contingência e desativação.

Além disso, a integração de uma equipe e o treinamento em um sistema e processo são definidos como requisitos.

Integridade dos dados e validação do sistema

A nova orientação identifica a integridade dos dados como uma pedra angular do Guia de Boas Práticas Clínicas. E declara que os sistemas de dados de teste devem garantir a integridade dos dados. Principalmente no que diz respeito a alterações de tecnologia e atualizações de software.

Sempre que houver uma alteração no design, operações ou configuração de um ensaio clínico, ou em um processo ou sistema de suporte, a integridade dos dados deve ser cuidadosamente avaliada com o objetivo de minimizar os riscos.

Ao usar o manuseio de dados de teste eletrônico ou sistemas remotos de dados de teste eletrônico, o patrocinador deve:

Executar a validação do sistema do computador

A abordagem para validação desses sistemas deve basear-se em uma avaliação de risco que leve em consideração o uso pretendido do sistema, bem como o potencial do sistema de afetar a segurança do indivíduo humano e a confiabilidade dos resultados dos ensaios clínicos.

Garantir a integridade dos dados e metadados

Garantir a integridade dos dados deve ser uma prioridade ao fazer alterações em sistemas computadorizados (por exemplo, atualizações de software, migração de dados, entre outros).

Monitoramento de ensaios clínicos com base em risco

De acordo com a nova orientação do adendo do ICH E6 (R2), o patrocinador deve “desenvolver uma abordagem sistemática, priorizada e baseada em risco para monitorar os ensaios clínicos. O patrocinador pode escolher o monitoramento no local, uma combinação de monitoramento no local e centralizado ou, quando justificado, monitoramento centralizado. O patrocinador deve documentar a lógica da estratégia de monitoramento escolhida.”

Uma abordagem baseada em risco para monitorar o estudo exige que o patrocinador desenvolva e siga uma abordagem otimizada para estudar a amostra. Embora o monitoramento no local seja realizado onde são realizando o ensaio clínico, o monitoramento centralizado é realizado remotamente e pode ajudar a reduzir a necessidade e a frequência do monitoramento no local.

O monitoramento centralizado usa gerenciadores de dados qualificados, bioestatísticos, entre outros, para analisar os dados coletados do ensaio clínico em tempo hábil, a fim de ajudar a determinar se os dados são confiáveis.

As orientações recomendam o uso de análise estatística dos dados coletados usando o monitoramento centralizado, a fim de “identificar dados ausentes, dados inconsistentes, discrepantes, falta inesperada de variabilidade e desvios de protocolo”. Quaisquer descobertas, decisões ou ações corretivas resultantes do monitoramento centralizado devem ser documentadas e arquivadas durante o julgamento com uma trilha de auditoria acessível.

Plano de monitoramento

O monitoramento de ensaios clínicos com base em riscos depende de um programa eficaz de gerenciamento de qualidade baseado em riscos. As orientações pedem o desenvolvimento de um plano de monitoramento pelo patrocinador adaptado aos riscos específicos de proteção de indivíduos humanos e integridade de dados do estudo.

O plano deve descrever a estratégia de monitoramento, as responsabilidades de monitoramento de todas as partes envolvidas, os vários métodos de monitoramento a serem usados ​​e a justificativa para seu uso. O plano também deve enfatizar o monitoramento de dados e processos críticos.

Atenção especial deve ser dada aos aspectos que não são prática clínica de rotina e que requerem treinamento adicional. O plano de monitoramento deve fazer referência às políticas e procedimentos aplicáveis.

Finalmente, a orientação ICH E6 (R2) discute a importância de relatar oportunamente os resultados do programa de monitoramento de ensaios (no local e centralizado) à equipe de gerenciamento do patrocinador responsável pelo estudo. Os resultados das atividades de monitoramento devem ser relatados com detalhes suficientes para permitir a verificação da conformidade com o plano de monitoramento.

O monitoramento baseado em risco exige que os dados incluídos nos relatórios de monitoramento estejam alinhados com a criticidade dos processos e dados monitorados. Quaisquer desvios de conformidade identificados nos relatórios ou ações corretivas tomadas devido a esses desvios precisam ser documentados de maneira rastreável.

Orientação à qualidade dos ensaios clínicos

O novo documento de orientação do adendo do Guia de Boas Práticas aborda alguns dos principais pontos de ineficiência e complexidade de ensaios clínicos. Como design de ensaios, segurança do paciente, integridade dos dados e validação de sistemas de computador. Juntamente com o gerenciamento e supervisão de ensaios clínicos.

Este documento de orientação atualiza os padrões para gerenciamento e monitoramento da qualidade de ensaios clínicos. Para refletir desafios comuns e novas tecnologias utilizadas em ensaios modernos. Com foco nas práticas de qualidade baseadas em risco, as orientações têm o potencial de oferecer suporte a maior eficiência e segurança do paciente. Além de melhor qualidade dos dados e economia de custos para ensaios clínicos.

Informações detalhadas sobre as Boas Práticas Clínicas podem ser encontradas nos sites do CONEP (Conselho Nacional de Saúde), no da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), no do Documento das Américas (no portal da ANVISA), e ainda no ICH (International Conference of Harmonization – em Inglês).

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Lucas Almeida

Cofundador e CRO da Nexxto

Trabalho todos os dias para ajudar o setor de saúde a ser mais digital e eficiente, possibilitando que mais pessoas no Brasil tenham acesso a serviços com qualidade e segurança.