Publicado em 4 fevereiro 2021 | Atualizado em 21 janeiro 2021

A Avaliação de Tecnologias em Saúde consiste numa análise sistemática das consequências clínicas, econômicas e sociais da utilização de tais tecnologias. É uma ferramenta que subsidia a seleção de insumos a serem financiados por determinado sistema de saúde.

As tecnologias em saúde compreendem o conjunto de vacinas, medicamentos, equipamentos, procedimentos técnicos, sistemas organizacionais, educacionais, de informação e de suporte. Essa denominação inclui também programas e protocolos assistenciais, por meio dos quais os cuidados são ofertados à população.

Vivenciamos um aumento expressivo das demandas de saúde, decorrentes do envelhecimento populacional, associado a maior incidência de doenças crônico-degenerativas. Mas não é só isso: os índices de acidentes e de violência também cresceram, exigindo tratamentos cada vez mais complexos e caros

Segundo levantamento da Organização Mundial da Saúde, o gasto atual com saúde representa 10% do produto interno bruto (PIB) mundial. No caso do Brasil, o Banco Mundial estimou que 8% do nosso PIB estão comprometidos com o orçamento da saúde.

A saúde é um bem intangível, altamente valorizado pela sociedade. Por outro lado, até os países mais ricos enfrentam dificuldades para custear suas demandas de saúde. Em outras palavras, nenhum sistema de saúde consegue pagar tudo para todos.

Adicionalmente, existe uma pressão constante da sociedade e do mercado para incorporação de novas tecnologias em saúde, que costumam ser mais caras. A questão é saber até que ponto elas são realmente melhores do que as alternativas convencionais.

Diante desse cenário de escassez de recursos, a Avaliação de Tecnologia em Saúde representa uma ferramenta fundamental para fazer escolhas difíceis. Tais decisões deverão ser amparadas não apenas por critérios de segurança e qualidade, mas também por análises de custo-efetividade.

Como reduzir o gasto em saúde sem perder a qualidade?

Para assegurar a melhor assistência à saúde e o melhor estado de saúde possível, dentro dos limites de recursos, é preciso repensar gastos e rever prioridades. Para isso, a Avaliação de Tecnologias em Saúde considera quatro aspectos fundamentais:

  • Segurança: os benefícios devem superar os riscos associados à tecnologia em saúde e a probabilidade de provocar efeitos adversos deve ser a menor possível;
  • Eficácia: as tecnologias em saúde devem demonstrar bons resultados para a condição de saúde alvo em ensaios clínicos controlados, ou seja, num cenário ideal de pesquisa científica;
  • Efetividade: as tecnologias em saúde precisam funcionar bem no mundo real em diferentes cenários, sendo utilizadas por pacientes com perfis distintos e graus variáveis da condição de saúde alvo;
  • Eficiência: além de funcionar bem em condições reais, essa qualidade deve estar associada a um custo acessível dos produtos ou serviços de saúde.

Na prática, a Avaliação de Tecnologias em Saúde depende da análise de um grande volume de informações a respeito das tecnologias para responder perguntas complexas como:

  • Essa tecnologia é segura e eficaz?
  • Qual a sua disponibilidade no mercado?
  • Qual o custo para ser adquirida?
  • Como seu desempenho se compara com as alternativas disponíveis?

A resposta à primeira questão pode ser respondida por meio da chamada Medicina Baseada em Evidências. A análise sistemática dos resultados das pesquisas científicas exige um olhar crítico e apurado para selecionar e analisar os estudos mais significativos e confiáveis.

As demais perguntas serão respondidas por meio de avaliações econômicas. Afinal, o mercado da saúde é um cenário de escassez de recursos, em que é preciso escolher no que investir. Tais decisões devem considerar o custo-efetividade e o impacto orçamentário.

Os Cinco passos da Avaliação de Tecnologias em Saúde no SUS

A saúde é direito de todos, amparado pela Constituição Federal. Para custeá-lo, o Ministério da Saúde conta com a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec).

Desse modo, a incorporação de tecnologias inovadoras nos serviços do SUS depende de uma criteriosa análise de custo-efetividade, envolvendo cinco etapas:

  • Identificar tecnologias prioritárias a serem estudadas, considerando a relevância para o quadro da saúde coletiva e especificando o problema a ser avaliado;
  • Realizar pesquisas a partir de diversas fontes de informação, sintetizá-las e interpretar as evidências, criando argumentos;
  • Formular toda a proposta com base na pesquisa e nos resultados obtidos;
  • Disseminar a conclusão obtida – divulgar resultados a partir de consultas públicas;
  • Monitorar e acompanhar o impacto das recomendações.

Os Tipos de Avaliações Econômicas em Saúde

Geralmente, as novas tecnologias em saúde agregam custos significativos, quando comparadas com as tecnologias convencionais. Assim, uma tomada de decisão racional deve estabelecer se o benefício agregado está em proporção razoável com o custo que adiciona.

O principal objetivo das avaliações econômicas é, portanto, comparar o valor relativo de diferentes tecnologias em saúde. Essas análises darão suporte às decisões relacionadas à alocação de recursos.

A Economia da Saúde é uma ciência que procura estabelecer uma razão entre custos e desfechos ou resultados em saúde. Enquanto o uso dos recursos é sempre mensurado em unidades monetárias, as formas de mensuração das consequências (ou resultados) variam.

Desse modo, o tipo de Avaliação Econômica depende da pergunta a ser respondida e se dividem em quatro tipos de Avaliação:

  • Custo–benefício;
  • Custo-minimização;
  • Custo-efetividade;
  • Custo-utilidade.

Vamos conhecer cada uma delas.

Avaliações de Custo-Benefício

As avaliações de custo-benefício comparam os custos e benefícios de duas ou mais alternativas terapêuticas em termos monetários. Desse modo, podem responder à pergunta: “É socialmente rentável investir em determinada tecnologia em saúde?”.

Assim, as Avaliações de custo-benefício permitem comparar tecnologias em saúde que produzem resultados diferentes. Por exemplo: é melhor prevenir ou tratar determinada doença?

Por outro lado, ainda existe muita dificuldade para atribuir valores monetários a determinadas condições de saúde, o que limita o uso deste tipo de avaliações econômicas.

Avaliações de Custo-Minimização

As avaliações de custo-minimização, por sua vez, comparam estratégias com efetividade semelhante para responder à pergunta: “Qual é a tecnologia em saúde de menor custo?”

Na prática, é raro encontrar tecnologias em saúde que apresentem desfechos quantitativamente equivalentes. Isso faz com que a aplicação da Avaliação de custo-minimização seja bastante limitada e, consequentemente, pouco utilizada.

Avaliações de Custo-Efetividade

As avaliações de custo-efetividade, respondem questões do tipo: “Qual é a tecnologia em saúde que oferece a melhor relação entre os seus custos e os resultados obtidos através dela?”

As avaliações de custo-efetividade são as mais usadas. O resultado é expresso em uma razão de unidades de custo por benefício, que é medido sob a forma de efetividade (anos de vida ganhos ou número de pacientes curados, por exemplo).

Avaliações de Custo-Utilidade

Finalmente, as avaliações de custo-utilidade, avaliam o custo e impacto das tecnologias em saúde sobre a qualidade e duração da sobrevida livre da doença.

Neste último caso, a pergunta a ser respondida é: “Qual é a alternativa com melhor relação entre custos e resultados, em termos da qualidade e duração da sobrevida obtida?”.

Análises de custo-utilidade consideram o valor que a sociedade atribui a determinado resultado, trazendo um olhar humanístico para as avaliações econômicas. A “utilidade” varia de saúde perfeita até morte e seu valor pode ser medido com escalas de qualidade de vida.

A análise de custo-utilidade é, portanto, uma variante da avaliação de custo-efetividade, onde os resultados são medidos em termos de duração de vida e qualidade da sobrevida. A diferença é que, no estudo de custo-utilidade, o valor é dado pelo consumidor.

Principais Vantagens e Desvantagens das Avaliações Econômicas

Em suma, cada tipo de Avaliação Econômica possui vantagens e desvantagens, que foram resumidas no quadro a seguir:

quadro avaliação de tecnologias em saúde

Quadro 1: Tipos e características das principais vantagens e desvantagens da Avaliação Econômica.

A Economia contribui para viabilizar a Assistência em Saúde

Enfim, é importante frisar que a economia não deve ser o único parâmetro para decidir sobre a incorporação ou não de uma determinada tecnologia em saúde. Existem também aspectos de ordem social, técnica, científica e ética a serem considerados.

Por outro lado, as avaliações econômicas introduzem um olhar mais abrangente. Uma nova tecnologia em saúde pode ser mais efetiva que um tratamento padrão, mas geralmente seu benefício vem acompanhado de custos adicionais, que podem limitar ou inviabilizar sua oferta.

Dessa forma, estabelecer se o benefício adicional está em proporção razoável com o custo incremental, é uma questão-chave para alocação eficiente de recursos. Essa análise permite preservar a viabilidade do sistema de saúde como um todo, racionalizando a assistência.

Até a indústria farmacêutica utiliza avaliações econômicas para decidir quais produtos desenvolver, como traçar suas estratégias de marketing e definir preços. Além disso, agências regulatórias do mundo todo adotam essas avaliações para analisar novos produtos para a saúde.

Atualmente, a incorporação de novas tecnologias em saúde para o SUS é precedida da análise realizada pela Conitec. Por outro lado, o segmento privado ainda não possui uma forma institucionalizada de Avaliação de Tecnologias em Saúde.

Assim, o sistema de avaliação do setor público precisa ser aprimorado e expandido para o segmento privado. Com o uso racional dos recursos disponíveis, a oferta de produtos e serviços de assistência à saúde poderá ser ampliada.

Enquanto isso, nada impede as organizações de adotarem critérios de segurança, eficácia, efetividade e eficiência em sua prática. Certamente isso contribuirá para elevar os padrões de qualidade dos serviços prestados. Então, o momento de começar é agora!

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Márcia Rodriguez Vásquez Pauferro

Farmacêutica Hospitalar

Farmacêutica formada pela USP, especialista em Farmácia Hospitalar e Qualidade e Segurança no Cuidado ao Paciente, Mestre em Bioética.