Publicado em 1 outubro 2020 | Atualizado em 29 setembro 2020

Desde que a pandemia da Covid-19 foi declarada pela OMS, as cirurgias eletivas foram suspensas em todos os hospitais brasileiros. Na ocasião, a Anvisa emitiu uma nota técnica recomendando o adiamento dos procedimentos.

O impacto foi sentido nos sistemas de saúde ao redor do mundo, que também mudaram sua rotina de procedimentos cirúrgicos em razão do coronavírus.

Nesse sentido, muitos hospitais não apenas adiaram, mas cancelaram cirurgias por dois motivos principais: 1) evitar a presença de pacientes no ambiente hospitalar, que é mais propício à doença e; 2) preservar a capacidade de leitos de UTI para receber pessoas em estágio grave de Covid-19.

Apesar de ser uma medida de segurança necessária, a ausência dos procedimentos causou um impacto financeiro significativo nas instituições hospitalares. De acordo com a Federação Brasileira de Hospitais (FBH), a queda no faturamento das instituições privadas, principalmente as de pequeno e médio porte, chegou a 40% durante o período de suspensão.

E não é só a saúde suplementar que sofre os impactos da pandemia. Afinal, a ameaça de fechamento de hospitais privados por falta de verbas atinge diretamente pacientes do SUS. Isso porque somente os hospitais filiados à FBH já são responsáveis por 62% dos atendimentos públicos.

Para entender melhor como a pandemia impactou o setor e de que modo essa retomada nos procedimentos será recebida, acompanhe o artigo!

O que são as cirurgias eletivas?

O termo “eletivo” é utilizado para diferenciar procedimentos cirúrgicos preventivos ou essenciais daqueles considerados de emergência. No entanto, é importante ressaltar que o termo pode soar equivocado. Especialmente quando comparado ao sinônimo “opcional”.

Ou seja, as cirurgias eletivas não são opcionais, e esses procedimentos precisam ser realizados o quanto antes, para evitar prejuízo à saúde do paciente. Todavia, alguns apresentam menor grau de urgência, sendo possível ao paciente aguardar um certo tempo para sua realização sem maiores consequências.

Porém, existem ainda as cirurgias eletivas essenciais, que demandam maior agilidade na realização. Um exemplo são as cirurgias oncológicas, cardíacas e outras consideradas de alta complexidade.

Para definir a necessidade de um procedimento cirúrgico, é preciso que o paciente passe em consulta com um especialista e receba o diagnóstico indicando a cirurgia como parte do tratamento.

Contudo, um detalhe importante sobre procedimentos eletivos é o pré-operatório, que precisa ser mais completo. Como a cirurgia é feita por agendamento, antes são necessários exames que mostrarão se o paciente está apto ao procedimento.

Esse pré-operatório, em alguns casos, demanda mais tempo dentro do ambiente hospitalar, e também exige mais gastos com material clínico e laboratorial, entre outros.

Ou seja, a demanda das cirurgias eletivas, ao mesmo tempo que gera um alto custo para o hospital, também gera a maior receita. Seja através dos atendimentos particulares, das operadoras de plano de saúde ou mesmo de repasses públicos.

Receita gerada por cirurgias eletivas

Nos hospitais privados, as cirurgias eletivas representam a maior fonte de receita e margem de lucro frente a outros procedimentos. Estima-se que cerca de 70% do faturamento de um hospital seja oriundo de procedimentos cirúrgicos.

Segundo o Observatório 2020 da Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), que compila uma série de dados para a gestão hospitalar, no ano de 2019 foram realizadas 1.926.716 de cirurgias entre as 122 instituições associadas.

No entanto, como a maior parte dos procedimentos (cerca de 89% nos hospitais membros da Anahp) é feita em pacientes que utilizam planos de saúde, a instituição também carece do repasse das operadoras. Em geral, o tempo médio de pagamento dos procedimentos varia de 45 a 60 dias. Isso sem contar a alta ocorrência de glosas médicas, que levam à perda de faturamento.

Suspensão dos procedimentos: qual o impacto financeiro causado pela pandemia?

Na maioria dos países, a pandemia de Covid-19 causou uma mudança brusca no cotidiano das instituições de saúde. Em termos econômicos, o impacto foi sentido mesmo em países mais ricos. Isso ocorreu porque, além do adiamento de cirurgias eletivas, a população também passou a evitar hospitais e clínicas para outros fins.

Conforme traz um artigo da Healthcare Financial Management Association (HFMA), uma análise no volume de procedimentos realizados em 228 hospitais americanos mostrou que o número de pacientes que procurou atendimento hospitalar nas primeiras semanas da pandemia caiu 54,5%, comparado ao mesmo período de 2019.

O fator crítico se agrava quando são analisados os procedimentos principais de cirurgia e internação, que representam mais de 50% da receita anual do sistema de saúde americano. Destes, três tipos de cirurgias de custo mais alto tiveram uma queda de 79% a 99%.

Enquanto isso, no Brasil, os números são bastante semelhantes entre os hospitais privados. Em alguns lugares, foi registrada uma diminuição de 90% na a taxa de ocupação de leitos.

A consequência na queda brusca de receita foi a dispensa de funcionários e redução da carga horária. Ao mesmo tempo, o quadro reduzido prejudicou o atendimento, gerando sobrecarga em quem continuou na linha de frente.

Nesse ínterim, outro ponto desfavorável para as finanças foi o preço inflacionado dos EPIs (cerca de 400%) e suprimentos hospitalares em geral. Isso atingiu em cheio o caixa das instituições, aumentando os custos, enquanto a receita despenca.

Alguns hospitais, especialmente os de pequeno e médio porte, buscaram alternativas de crédito para manter as contas em dia e não precisar fechar as portas.

Retomada das cirurgias eletivas frente à Covid-19

Mesmo com os casos de Covid-19 ainda elevados, os sistemas de saúde clamaram pela volta das cirurgias eletivas. Nos EUA, assim como no Brasil, já ocorre uma retomada gradativa. Por aqui, cada estado analisou sua situação e retomou, aos poucos, a realização de procedimentos cirúrgicos.

Porém, essa volta teve início muitos meses depois do início da pandemia. Consequentemente, há um represamento dessas operações, com a alta demanda e as mudanças operacionais que foram feitas.

Assim, o número de cirurgias eletivas em espera, somado aos novos procedimentos vão de encontro à capacidade reduzida dos hospitais. O que deverá resultar numa lista de espera significativa, e também demandará a realização de mutirões para acelerar o processo.

Além disso, agora os hospitais terão que se adaptar ao “novo normal”, elevando os cuidados pré e pós-operatórios e, até mesmo, aderindo a tecnologias que otimizem tarefas e recursos. Tudo que se converta em procedimentos mais rápidos e seguros será necessário para enfrentar o momento crítico inicial dessa retomada.

Aliás, alguns hospitais já sentiram o impacto do aumento substancial de cirurgias eletivas. De acordo com o Hospital Samaritano Higienópolis, a retomada já mostrou um crescimento de 275% nos procedimentos eletivos em geral. O destaque é para a otorrinolaringologia, que registrou aumento de 608% nas cirurgias.

Medidas preventivas e de segurança

O ambiente hospitalar por si só já é crítico. E com a presença da Covid-19, todos os cuidados tiveram de ser redobrados, para evitar o contágio.
Assim, a retomada desse procedimento exigiu uma série de medidas de segurança para atendimento aos pacientes. A partir de agora, os fluxos são individualizados, incluindo consultas e exames.

Também foi adotado um sistema com horários mais espaçados, devido à necessidade de higienização completa após cada atendimento. Em alguns hospitais, as admissões estão sendo realizadas por meio de um check-in telefônico, evitando ao máximo o contato presencial com os pacientes.

Quando da realização da cirurgia, o paciente é encaminhado diretamente para o quarto hospitalar. Além disso, são montadas alas de centro cirúrgicos exclusivas para pacientes ‘não Covid’.

Antes do procedimento, também é necessária a realização do teste PCR. Nesse sentido, os processos tiveram a segurança ampliada, até o momento em que o paciente recebe alta.

Sistema de cores e EPIs

Alguns hospitais privados também estão adotando o sistema de cores para identificação de áreas de risco. Na rede privada, o modelo mais frequente é o que utiliza o seguinte formato:

  • Verde: áreas para pacientes com teste negativo para Covid-19;
  • Azul ou amarela: áreas para pacientes que aguardam o resultado do teste;
  • Vermelha: áreas destinadas aos pacientes infectados pelo coronavírus.

Outra medida de segurança foi o investimento em EPIs, a exemplo das máscaras cirúrgicas. Alguns hospitais trocaram o modelo simples por máscaras do tipo N95, mais resistentes, com melhor filtragem do ar e maior durabilidade. Além disso, também o uso do escudo facial (face shield) também foi aderido.

O que se vê nesse momento, é que uma gestão hospitalar eficiente exerce papel fundamental para “equilibrar os pratos” e vencer a crise. Dessa forma, enfrentar obstáculos e atender a demanda do “novo normal” pós pandemia exige criatividade esforço conjunto de diversos setores.

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Lucas Almeida

Cofundador e CRO da Nexxto

Trabalho todos os dias para ajudar o setor de saúde a ser mais digital e eficiente, possibilitando que mais pessoas no Brasil tenham acesso a serviços com qualidade e segurança.