Publicado em 11 junho 2020 | Atualizado em 26 maio 2020

As vacinas estão entre as ações prioritárias de Atenção Primária à Saúde (APS). São elas as responsáveis pelas melhorias gerais de saúde de toda a população e representam um grande avanço tecnológico na área médica. Porém, o processo de conservação de vacinas é um dos pontos mais críticos para garantir sua máxima eficiência.

No Brasil, o Programa Nacional de Imunização (PNI) é considerado como modelo para outros países. Além de ser reconhecido como pioneiro na introdução de algumas vacinas e demonstrado alta capacidade técnica nas questões de logística para imunização. Porém, ainda há muitas deficiências em todo o processo de conservação, que afetam diretamente a qualidade dos imunobiológicos.

Estudo do Departamento de Saúde Pública e Ciências do Comportamento da Universidade de Pernambuco, apontaram que em 39 unidades básicas de saúde (UBS) da grande Recife, 61,5% não monitoram a temperatura da caixa térmica de conservação de vacinas. E 46,1% das geladeiras apresentam vedação inadequada. Há ainda a inexistência de termômetros de cabo extensor para monitoramento das caixas térmicas.

São fatores como esses que podem contribuir para a exposição dos imunobiológicos a variações de temperaturas e consequente inativação dos componentes imunogênicos. Caso sejam utilizadas, podem trazer sérios riscos à saúde de quem receber a dose da vacina.

O que são imunobiológicos?

Os imunobiológicos incluem substâncias antigênicas, como vacinas e toxóides. Ou até mesmo preparações contendo anticorpos, como globulinas e antitoxinas, de doadores humanos ou animais. Estes produtos são utilizados para imunização ou terapia ativa ou passiva.

Alguns exemplos de imunobiológicos são:

Vacina

Suspensão de microrganismos vivos (geralmente atenuados) ou inativados (por exemplo, bactérias, vírus ou rickettsias) ou frações administradas para induzir imunidade e prevenir doenças infecciosas ou suas seqüelas.

Algumas vacinas contêm antígenos altamente definidos (por exemplo, o polissacarídeo de Haemophilus influenzae tipo b ou o antígeno de superfície da hepatite B). Outros possuem antígenos complexos ou incompletos (por exemplo, Bordetella pertussis mortos ou vírus vivos atenuados).

Toxóide

O imunobiológico toxóide é uma toxina bacteriana modificada que foi tornada não-tóxica. Porém mantém a capacidade de estimular a formação de antitoxina.

Globulina imunológica (GI)

Trata-se de uma solução estéril contendo anticorpos do sangue humano. É obtido por fracionamento com etanol frio de grandes reservatórios de plasma sanguíneo e contém 15% a 18% de proteína.

Destinado à administração intramuscular, o GI é indicado principalmente para manutenção de rotina da imunidade de certas pessoas imunodeficientes e para imunização passiva contra sarampo e hepatite A. O GI não transmite vírus da hepatite B, vírus da imunodeficiência humana (HIV) ou outras doenças infecciosas.

Imunoglobulina intravenosa (IGIV)

Um produto derivado do plasma sanguíneo de um grupo de doadores semelhante ao GI, mas preparado para ser adequado para uso intravenoso. IGIV não transmite doenças infecciosas.

É usado principalmente para terapia de substituição em distúrbios primários por deficiência de anticorpos, para o tratamento da doença de Kawasaki, púrpura trombocitopênica imune, hipogamaglobulinemia na leucemia linfocítica crônica e alguns casos de infecção pelo HIV.

Imunoglobulina específica

Trata-se de preparações especiais obtidas do plasma sanguíneo de doadores pré-selecionados para um alto conteúdo de anticorpos contra um antígeno específico (por exemplo, imunoglobulina da hepatite B, imunoglobulina varicela-zoster, imunoglobulina anti-rábica, globulina imune ao tétano, globulina imune à vacina e imunoglobulina do citomegalovírus). Como o GI e o IGIV, essas preparações não transmitem doenças infecciosas.

Antitoxina

Uma solução de anticorpos (por exemplo, antitoxina para difteria e antitoxina botulínica) derivada do soro de animais imunizados com antígenos específicos. Antitoxinas são usadas para conferir imunidade passiva e para tratamento.

Manuseio e conservação de vacinas

A cadeira do frio é o sistema utilizado pelo PNI (Programa Nacional de Imunizações), que tem o objetivo de assegurar que os imunobiológicos disponibilizados no serviço de vacinação sejam mantidos em condições adequadas de transporte, armazenamento e distribuição. Isso garante a conservação de vacinas permaneça com suas características iniciais até o momento da sua administração.

Alterações de temperatura (excesso de frio ou calor) podem comprometer a potência imunogênica, o que pode acarretar a redução ou a falta do efeito esperado. Os imunobiológicos, enquanto produtos termolábeis e/ou fotossensíveis, necessitam de armazenamento adequado para que suas características imunogênicas sejam mantidas.

O não-cumprimento das especificações recomendadas para armazenamento e manuseio de imunobiológicos pode tornar esses produtos ineficazes. As recomendações incluídas nas bulas de um produto, incluindo a reconstituição de vacinas, devem ser seguidas de perto para garantir a máxima eficácia das vacinas.

A qualidade é de responsabilidade compartilhada de todas as partes, desde o momento em que a vacina é fabricada até o momento da administração. Em geral, todas as vacinas devem ser inspecionadas e monitoradas para garantir que a cadeia do frio seja mantida durante o transporte e o armazenamento.

A conservação de vacinas deve ser feita nas temperaturas recomendadas imediatamente após o recebimento. Certas vacinas, como a vacina oral contra a poliomielite e a vacina contra a febre amarela, são muito sensíveis ao aumento da temperatura. Outras vacinas são sensíveis ao congelamento, incluindo vacina contra difteria e tétano e pertussis, vacina pneumocócica e vacina contra influenza.

O que é a Rede de frio?

A Rede de Frio é a estrutura técnico-administrativa (normatização, planejamento, avaliação e financiamento) direcionada para a manutenção adequada do imunobiológico. Ela representa o processo logístico (recebimento, armazenamento, distribuição e transporte) da Rede de Frio. A sala de vacinação é a instância final da Rede de Frio, onde os procedimentos de vacinação propriamente ditos são executados mediante ações de rotina, campanhas e outras estratégias.

Na sala de vacinação, a conservação de vacinas devem ocorrer entre +2ºC e +8ºC, sendo ideal +5ºC. Já os instrumentos para monitoramento e controle da temperatura são os recursos utilizados para o monitoramento e o controle da temperatura dos equipamentos de refrigeração e das caixas térmicas que irão armazenar os imunobiológicos.

Na sala de vacinação, tal como descrito no Manual de Rede de Frio (2013), o PNI recomenda a utilização de instrumentos que realizam o registro contínuo das temperaturas máxima e mínima registradas nos equipamentos durante determinado período de tempo.

Além disso, na sala de vacinação, o armazenamento dos imunobiológicos é feito em equipamentos como as câmaras refrigeradas, os refrigeradores domésticos e em insumos como as caixas térmicas.

Manuseio

As pessoas que administram vacinas devem tomar as precauções necessárias para minimizar o risco de disseminação da doença. Eles devem ser adequadamente imunizados contra hepatite B, sarampo, caxumba, rubéola e gripe. Tóxicos ao tétano e à difteria são recomendados para todas as pessoas.

As mãos devem ser lavadas antes de cada novo paciente ser visto. Luvas não são necessárias ao administrar vacinas, a menos que as pessoas que administram a vacina entrem em contato com fluidos corporais potencialmente infecciosos ou tenham lesões abertas nas mãos. Seringas e agulhas usadas para injeções devem ser estéreis e preferencialmente descartáveis ​​para minimizar o risco de contaminação.

Uma agulha e seringa separadas devem ser usadas para cada injeção. Vacinas diferentes não devem ser misturadas na mesma seringa, a menos que seja especificamente licenciado para esse uso.

Plano de contingência na conservação de vacinas

Todo serviço de saúde que trabalhe com imunobiológicos deve contar com um Plano de Contingência específico para o armazenamento. Ele descreve quais procedimentos devem ser adotados quando o equipamento de refrigeração deixar de funcionar por quaisquer motivos.

Por exemplo, quando houver interrupção no fornecimento de energia, o equipamento deve ser mantido fechado e a temperatura interna deve ser rigorosamente monitorada. Se não houver o restabelecimento da energia ou quando a temperatura estiver próxima a 7º C, deve ser feita a transferência imediata dos imunobiológicos para outro equipamento (refrigerador ou caixa térmica) com a temperatura recomendada (entre 2º C e 8º C).

O mesmo procedimento deve ser adotado em caso de falha do equipamento. Quando isso ocorrer, deve-se comunicar o mais rapidamente possível à direção do serviço de saúde, visando medidas a serem tomadas.

Caso ocorra qualquer problema na Rede de Frio, ou houver suspeita ou constatação de que um determinado imunobiológico foi submetido a condições que provoquem desvio na sua qualidade, cabe ao responsável comunicar a ocorrência ao responsável técnico pelo serviço de vacinação. Além disso, é necessário identificar, separar e armazenar o produto em condições adequadas da Cadeia do Frio.

De acordo com o Plano Nacional de Imunização, quando isso ocorrer, é necessário o preenchimento do formulário de alterações diversas (Desvio de Qualidade), disponível no Manual de Rede de Frio (2013), e encaminhá-lo à Coordenação Municipal de Imunizações. O formulário deverá ser submetido à CGPNI (Coordenação Geral do Programa Nacional de Imunizações) por intermédio da Coordenação Estadual.

Avanços e cuidados

O Programa Nacional de Imunização brasileiro tem alcançado êxito por meio de altas coberturas vacinais. Graças à elas, houve uma queda drástica na incidência de doenças que costumavam matar milhares de pessoas todos os anos até a metade do século passado – como coqueluche, sarampo, poliomielite e rubéola.

Porém, é preciso destacar que não basta alcançar altas taxas de coberturas, é preciso também garantir que as vacinas aplicadas estejam com suas propriedades imunizantes preservadas. Para isso é necessário uma série de cuidados com a conservação e o armazenamento correto.

Seguindo protocolos rígidos de conservação de vacinas, e com o apoio da tecnologia no monitoramento da temperatura, é possível garantir sua qualidade e reduzir drasticamente potenciais perdas ou riscos às pessoas.

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Lucas Almeida

Cofundador e CRO da Nexxto

Trabalho todos os dias para ajudar o setor de saúde a ser mais digital e eficiente, possibilitando que mais pessoas no Brasil tenham acesso a serviços com qualidade e segurança.