5 de maio é o dia nacional do uso racional de medicamentos. A data foi escolhida para alertar que o uso inadequado de medicamentos pode trazer sérios prejuízos à saúde e que os resultados associados à farmacoterapia podem ser maximizados.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o uso racional de medicamentos (URM) ocorre quando o paciente recebe o medicamento apropriado para suas necessidades, nas doses individualmente requeridas para um adequado período de tempo e ao menor custo possível.
Cabe esclarecer que ser saudável não depende apenas do acesso a serviços e produtos de saúde. Desse modo, a saúde é também determinada pelas condições de vida, alimentação, educação e renda, dentre outros aspectos que extrapolam a capacidade de resolução dos sistemas de saúde.
Adicionalmente, a questão do uso racional de medicamentos ganhou destaque devido ao fato de estarmos enfrentando uma nova doença para a qual ainda não existe tratamento seguro e efetivo: a Covid-19.
Nesse contexto, observou-se aumento do consumo de certos medicamentos, inicialmente cotados para combater o novo coronavírus. O uso de hidroxicloroquina e ivermectina, por exemplo, levou ao desenvolvimento de severas lesões no fígado e não trouxe benefícios palpáveis.
Medicamentos: do uso inadequado rumo ao uso racional
Na verdade, os medicamentos figuram entre os principais agentes causadores de intoxicações nas últimas décadas. Segundo dados mais recentes do Sistema Nacional de Informações Tóxico-farmacológicas (Sinitox), os medicamentos responderam por 27% das ocorrências.
Adicionalmente, a OMS aponta que metade dos medicamentos é prescrito/dispensado/vendido de forma inadequada. O problema é ainda maior, considerando que 50% dos pacientes os utilizam de forma incorreta e quase um 1/3 da população carece de medicamentos essenciais.
Reconhecidamente, os fármacos fazem parte da maioria dos tratamentos de saúde. Entretanto, a crença exagerada na sua capacidade de resolver problemas de saúde pode levar ao uso desmedido, trazendo mais riscos do que benefícios.
Vejamos então, como proporcionar o uso racional de medicamentos, incluindo aqueles que exigem prescrição e os de venda livre, utilizados por automedicação. Vamos começar pela compreensão do verdadeiro papel desses produtos nos sistemas de saúde.
O papel dos medicamentos no sistema de saúde
Certamente, os medicamentos compõem uma das principais ferramentas terapêuticas na assistência à saúde. Assim, de acordo com a organização Mangement Sciences for Health, os medicamentos são importantes por cinco razões principais:
- Preservam a vida e melhoram a saúde;
- Promovem confiança e participação nos serviços de saúde;
- São caros;
- São distintos de outros produtos de consumo;
- É possível melhorar seu uso e provisão.
Além disso, os medicamentos devem ser seguros e eficazes. Lembrando que seus reais benefícios e riscos serão verdadeiramente conhecidos somente quando utilizados em larga escala, em situações reais e muito distintas dos ensaios controlados que embasaram a aprovação do uso do medicamento.
Em contrapartida, muitos medicamentos são utilizados de forma irracional. É relativamente comum o uso de antidiarreicos para diarreias infecciosas e antibióticos para combater amigdalites virais. Ambos os usos só trazem efeitos adversos, sem combater as causas dos problemas de saúde.
Dentre as razões para o uso irracional tem-se: falta de conhecimento ou informação de fonte confiável; automedicação sem orientação; falhas na formação dos profissionais da saúde; e propaganda abusiva, aliada aos incentivos financeiros para venda.
O uso inadequado de medicamentos produz impactos negativos, reduzindo a qualidade do cuidado e aumentando a morbimortalidade. Acrescente-se ainda, o desperdício de recursos, sobretudo quando são associados diversos medicamentos cuja real necessidade é questionável (polifarmácia).
Diante do exposto, para que os medicamentos exerçam seu verdadeiro papel no sistema de saúde, é indispensável a adoção de políticas de medicamentos.
Política nacional de medicamentos
Desde 1975, a Organização Mundial da Saúde alerta para a necessidade de formulação de políticas farmacêuticas que garantam o acesso a medicamentos seguros e eficazes. Nesse contexto, se inclui a política de medicamentos.
Assim, a Política Nacional de Medicamentos (PNM) tem como objetivos primordiais: garantir a segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos, ao menor custo possível; promover o uso racional dos medicamentos; e assegurar o acesso da população aos medicamentos essenciais.
Nesse sentido, os medicamentos essenciais são definidos pela Organização Mundial da Saúde como aqueles que satisfazem as necessidades prioritárias de cuidado de saúde da população. A escolha deve, também, levar em consideração critérios de eficácia, segurança e custo-efetividade.
Por fim, a formulação de uma PNM depende da vontade política dos governos. Adicionalmente, para ganhar legitimidade, a PNM requer a participação de todos os componentes do setor farmacêutico, incluindo profissionais, universidades, consumidores, produtores e organizações de saúde.
Muito se fala no papel dos profissionais e entidades, esquecendo que o consumidor é o maior interessado no uso racional de medicamentos. Sendo assim, vejamos qual o seu papel nesse cenário.
A Automedicação em si não é um problema
A Organização Mundial da Saúde reconhece que a automedicação ocupa papel importante no autocuidado. Assim, nem toda automedicação é irracional, mas é preciso que o usuário obtenha informações para fazer escolhas de forma responsável no caso de transtornos menores.
Os transtornos menores são enfermidades agudas, de baixa gravidade e limitadas a um breve período de tempo. Tais situações podem ser tratadas de forma eficaz e segura com medicamentos e outros produtos com finalidade terapêutica, cuja dispensação não exija prescrição médica.
Nesse sentido, o farmacêutico pode orientar os usuários nas farmácias e drogarias. Durante a dispensação, o consumidor deve ser orientado sobre o uso correto do medicamento, bem como as interações com medicamentos e alimentos, os principais efeitos colaterais e contraindicações.
Assim, a OMS define a automedicação responsável como a prática pela qual os indivíduos tratam os seus problemas de saúde com medicamentos aprovados e disponíveis para serem adquiridos sem prescrição, que sejam seguros e efetivos quando utilizados como indicado.
Dessa forma, a automedicação pode ajudar a desafogar os serviços de saúde. Para isso, deverá estar atrelada a medidas de regulação sanitária, que permita livre acesso apenas aos produtos seguros e eficazes para autoconsumo, combinados com mecanismos de informação e orientação.
As estratégias para promoção da automedicação responsável incluem também a qualidade da informação fornecida pelos fabricantes. Desse modo, os rótulos e as bulas dos medicamentos deverão trazer instruções claras sobre a indicação e uso, bem como eventuais riscos e contra indicações.
Informação: o melhor remédio contra o uso irracional de medicamentos
Informação é um componente essencial para promover o URM e melhorar os resultados em saúde. Orientar os consumidores é um desafio, mas capacitar os profissionais para extrair o máximo benefício dos medicamentos pode ser ainda mais complexo.
Nesse sentido, vale destacar o papel da Comissão de Farmácia e Terapêutica (CFT) e do Centro de Informações de Medicamentos (CIM) nas organizações hospitalares. Os mesmos princípios aplicáveis para escolha de medicamentos essenciais podem ser adotados na padronização de medicamentos.
Compete à CFT, com apoio do CIM, selecionar medicamentos com melhor relação de risco-benefício e custo-efetividade para atender às demandas institucionais. Adicionalmente, a CFT é responsável pela elaboração do Formulário Terapêutico, que deverá ser amplamente divulgado.
Esse formulário é uma forma de levar informações técnico-científicas confiáveis para que os profissionais promovam o URM na organização. Ele é um importante instrumento para que os medicamentos sejam prescritos e administrados de forma adequada, visando melhor qualidade na assistência.
Estratégias para promoção do uso racional de medicamentos
A promoção do uso racional de medicamentos depende da adoção de um conjunto de ações, como:
- Diagnosticar corretamente;
- Prescrever o tratamento correto, com as informações necessárias para o usuário, baseado em evidências científicas;
- Prescrever de modo legível, a fim de evitar inclusive problemas de dispensação e administração;
- Organizar o serviço, para que o usuário tenha acesso ao medicamento em quantidade suficiente e em tempo oportuno;
- Promover a adesão ao tratamento; e
- Avaliar e monitorar o usuário quanto à resposta terapêutica ou para qualquer problema relacionado aos medicamentos.
Além disso, o URM demanda o empenho dos diversos atores que, de alguma forma, influenciam ou participam da cadeia de utilização de medicamentos. Esses atores compreendem: o Estado; o mercado farmacêutico; os profissionais de saúde; e o usuário do serviço.
Assim, é preciso atuar em todo o ciclo da assistência farmacêutica: garantir seleção, aquisição e distribuição de medicamentos seguros e eficazes. Além disso, deve-se promover a prescrição, dispensação e administração de medicamentos de forma adequada, com base em protocolos atualizados.
O desenvolvimento de protocolos clínicos e o treinamento adequado para sua implementação são estratégias fundamentais para evitar efeitos adversos, diminuir intoxicações e fomentar o URM. O resultado é ainda melhor quando associados a medidas de educação e conscientização da população.
O URM demanda a reorientação das práticas de saúde
Enfim, a promoção do uso racional de medicamentos depende da reorientação das práticas de saúde. Trata-se de uma mudança de comportamento, onde o medicamento é tratado com a devida cautela. Isso só será possível mediante a análise de alguns aspectos gerenciais básicos, como:
- Recursos humanos: verificar se a quantidade de profissionais de saúde é suficiente para atender às demandas de saúde da população e assegurar sua devida qualificação. Assim, estarão aptos a desempenhar melhor seu papel na promoção do URM;
- Infraestrutura: investir no aporte tecnológico e nos materiais necessários para o bom funcionamento dos serviços prestados; e
- Mecanismos de decisão e controle: criar meios para auxiliar o gestor no planejamento, desenvolvimento e acompanhamento das atividades. Isso pode ser otimizado com o uso de tecnologias de informação.
Todos saem ganhando com o uso racional de medicamentos
Medicamentos racionalmente selecionados propiciam benefícios individuais, institucionais e nacionais. Ou seja, todos saem ganhando.
Para o paciente, a escolha racional proporciona melhores resultados terapêuticos (eficácia e segurança) a um menor custo.
Institucionalmente, por sua vez, ocorre a melhoria do padrão de atendimento, o sistema ganha maior resolubilidade e ocorre significativa redução de gastos.
Já no plano nacional, o uso racional de medicamentos melhora os índices de mortalidade, morbidade e qualidade de vida. Além disso, o URM aumenta a confiança do usuário nos medicamentos, nos profissionais e no sistema de saúde como um todo.
Que tal praticar o URM em sua instituição para conquistar mais clientes e ganhar maior credibilidade?
Você também pode se interessar pela Política Nacional de Assistência Farmacêutica e sua relação com aquisição de medicamentos.