Publicado em 3 dezembro 2020 | Atualizado em 26 novembro 2020

Quando falamos de reconciliação medicamentosa, tratamos de uma avaliação criteriosa dos medicamentos dos quais o paciente faz uso, antes que novas prescrições sejam realizadas. Isso porque a combinação de certos fármacos pode levar à ocorrência de eventos adversos, que tendem a interferir no tratamento.

Desse modo, sem que haja uma análise dos possíveis efeitos dessa combinação, se admite o risco de efeitos colaterais indesejados. Portanto, é fundamental estabelecer critérios de conhecimento e análise dos medicamentos de uso habitual do paciente para fins de prevenção e segurança.

Conforme um artigo publicado pela professora Jane H. Barnsteiner da Universidade da Pensilvânia, pacientes hospitalizados estão sujeitos, em média, a um erro de medicação diária. O que corrobora com pesquisas anteriores, que afirmam que esse é o tipo de erro mais comum e que mais afeta a segurança dos pacientes.

No artigo, também se apresenta a informação de que 40% dos erros de medicação sejam resultado da reconciliação inadequada. Seja na admissão, transferência ou alta do paciente. E que metade dessas ocorrência resulta em danos para a saúde e sucesso do tratamento.

Segundos os especialistas, a maioria dos eventos adversos poderia ser evitada caso o processo de reconciliação medicamentosa fosse realizado adequadamente. Nesse sentido, é necessário um emprego de esforços para que seja criada uma rotina de análise em todas as fases de transição do paciente, desde a admissão até sua alta.

Para isso, é preciso compreender os princípios e conhecer as ferramentas necessárias para implementar o processo na instituição.

O que é e como ocorre a reconciliação medicamentosa?

Ao dar entrada no hospital, cada novo paciente deve ter seu histórico de saúde analisado, bem como os medicamentos dos quais está fazendo uso. Sejam eles contínuos ou em decorrência de outros tratamentos.

Assim, um profissional de saúde é responsável pela chamada reconciliação medicamentosa. Ela consiste em avaliar cada medicamento, suas substâncias e possíveis combinações. Isso evita que os remédios de uso habitual interfiram no tratamento que o paciente receberá a partir daquele momento, e vice-versa.

Além disso, a dieta prescrita também deve tomar como base possíveis interações com as substâncias contidas nos remédios que estão sendo utilizados. Portanto, o objetivo central da reconciliação é evitar eventos adversos e erros de medicação, preservando a segurança do paciente e o resultado dos tratamentos.

Como é feito o processo de reconciliação

O processo de reconciliação medicamentosa requer que todas as prescrições do paciente sejam registradas num sistema. Nele, as equipes médica, de farmácia hospitalar e enfermagem podem acessar e analisar os dados.

Desse modo, quando um paciente dá entrada no hospital, deve possuir consigo as receitas ou mesmo as embalagens dos medicamentos que vem utilizando. Assim, o médico responsável pelo atendimento poderá avaliar se o tratamento deverá ou não ser mantido durante o período de internação. Ou mesmo se serão necessárias substituições de fórmulas e ajustes de dosagem.

Ao optar por manter as medicações, todas deverão ser descritas no sistema para que seja realizada a dispensação, conforme prescrito.

Segundo os princípios orientadores definidos pela Agência de Pesquisa e Qualidade em Saúde norte americana (AHRQ), um processo de reconciliação medicamentosa bem sucedido deve conter:

  • a definição de papéis e responsabilidades para cada etapa da reconciliação;
  • integração da reconciliação medicamentosa com o fluxo de trabalho já existente;
  • a formalização de um fluxograma com todas as etapas do processo;
  • adequação das considerações sobre o processo de reconciliação para os diferentes formatos da prática clínica.

Nesse sentido, todo o fornecimento e controle dos remédios deve ser feito por profissionais do hospital, tirando das mãos do paciente e de familiares a responsabilidade pela administração. Essa é uma parte fundamental do processo, para que se evite eventos adversos em decorrência de esquecimentos, problemas de dosagem, entre outros.

Por que aderir à reconciliação medicamentosa?

Implementar esse processo na rotina hospitalar é uma forma eficiente de prevenir erros e evitar a ocorrência de eventos adversos. Além disso, a prática também contribui para o uso racional de medicamentos.

Entre os erros de medicação que tendem a ser evitados, podemos citar:

  • falhas na prescrição de medicamentos de rotina, que venham a ser importantes durante a internação;
  • erros de dosagem ou de formas farmacêuticas;
  • registros imprecisos que levem a perda ou duplicação de doses;
  • falhas na especificação de quais medicamentos de rotina devem ser retomados ou descontinuados após a alta;
  • duplicação nas prescrições de alta, por combinação de marcas e nomes genéricos ou substituições do formulário hospitalar.

Além disso, aderir à reconciliação também pode prevenir discrepâncias entre medicamentos e eventos adversos potenciais no momento da admissão do paciente. Ou ainda, durante transferência de ala interna ou setor, e também para outras unidades de saúde.

E ainda, de acordo com um relatório do AHRQ, a relação do farmacêutico com essa prática leva a evitar a ocorrência de eventos adversos mesmo após a alta do paciente.

Ademais, esse tipo de rotina contribui para as boas práticas clínicas, para a gestão hospitalar e experiência do paciente.

Principais etapas e desafios na implementação

Existem alguns princípios básicos que devem ser levados em conta no planejamento de implementação da reconciliação medicamentosa. Principalmente porque, mesmo sendo aparentemente simples, sempre surgem desafios ao longo do processo. Vejamos:

  • Lista unificada

​​​​​​​O desenvolvimento de uma lista unificada que seja compartilhada por todas as equipes e profissionais é fundamental para documentar os registros de medicamentos habituais do paciente. Esta mesma lista deve ser utilizada por médicos, farmacêuticos e enfermeiros que estejam responsáveis pelo cuidado e atendimento. Para isso, o prontuário eletrônico é uma ferramenta que otimiza os processos e facilita a comunicação.

  • Atualização descentralizada

Todos os membros da equipe devem ser capazes de acessar e atualizar a lista de medicamentos conforme novas informações estejam disponíveis.
Definição de papéis

As responsabilidades e papéis desempenhados por todos os membros de cada equipe envolvida no processo devem ser criteriosamente definidas. Do mesmo modo, é importantes desenvolver um comportamento consistente para a prática da reconciliação medicamentosa.

  • Padronização

Simplificar os processos através da padronização é essencial para uma rotina eficiente, eliminando as redundâncias. Essa é uma etapa importante, que evitará a ocorrência de erros e eventos adversos de maneira mais objetiva. A padronização pode ser feita através de um fluxograma e da implementação de um POP.

  • Orientação de pacientes e familiares

Tanto quanto desafiadora, esta é uma etapa importante. Pois é preciso orientar e educar pacientes e familiares/cuidadores sobre reconciliação medicamentosa, uma vez que eles desempenham um papel de protagonismo no tratamento.

  • Relacionar o processo aos objetivos estratégicos

A reconciliação deve ser um processo alinhado com outros objetivos institucionais, especialmente aqueles relacionados com estratégias de gestão e desempenho. Essa rotina pode servir como ponto de partida para a implementação de outros protocolos, ou mesmo projetos de tecnologia que estejam relacionados com a qualidade dos serviços e satisfação do paciente.

Depois de entender o processo de reconciliação medicamentosa, aproveite para saber mais sobre a Política Nacional de Assistência Farmacêutica e sua relação com aquisição de medicamentos.

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Lucas Almeida

Cofundador e CRO da Nexxto

Trabalho todos os dias para ajudar o setor de saúde a ser mais digital e eficiente, possibilitando que mais pessoas no Brasil tenham acesso a serviços com qualidade e segurança.